dentre todas as pessoas do mundo.

Dentre todas as pessoas do mundo, é você.

Dentre todas as pessoas bonitas, feias, estranhas, interessantes, altas, baixas, magras, gordas, chatas, incríveis, mobrais, pós-graduadas, reclusas e falastronas, reais e dissimuladas, mudas e comunicativas, iguais e tão (in)diferentes, é mesmo você.

Você e essa sua beleza particular. Esse cabelo que teima em mudar de tempos em tempos, esses olhos que – ainda bem – nunca mudam, essa pinta propositalmente pintada logo acima dos lábios e esse jeito delicadamente estabanado de trombar em tudo e em todos a todo momento.

Você e esse seu jeito único. Esse seu foco desfocado que do nada acende de vez e faz o mundo acontecer, sua criatividade em ver espaços na casa para fazer o que quase ninguém faria, sua energia volátil que vai do 220 até desligar a chave de luz em emergência e hibernar um domingo inteiro.

Você e esse quê de só sei que nada sei. Essa sua vontade de cozinhar, mas não sujar nada; de assistir um filme, mas ficar impaciente na terceira cena; de esmagar as gatas, mas reclamar que elas fogem quando você aperta demais; de ficar na cama até tarde, mas de acordar cedo para viajar e conhecer o mundo antes que seja realmente tarde.

Dentre todas as pessoas desse mundo com 7 bilhões de nós, é você com quem gosto de dormir e acordar, concordar e retrucar, proteger e atacar, provocar, brigar e então decretar acordo de paz pelos próximos 100 anos que virão nas próximas 100 horas.

Dentre todas as pessoas do mundo, você.

quando digo que a amo.

Quando digo que a amo
não é sobre você
mas sim
sobre mim

Porque amor
ainda que dado
é egoísmo
disfarçado

Me dou
porque te quero
e pelo que sou
te espero

Amo mais o meu eu
que mora aí
e também o você
que fica aqui

A troca é justa
não equilibrada
eu sou seu tudo
você meu nada.

você em mim.

Hoje bem cedo, me deparei com seus olhos. Foi na rua de casa, entre a calma da floricultura e a avenida em brasa, em uma senhora que me fitou com o olhar risonho.

Ainda outro dia, me deparei com seu sorriso. Foi na fila do supermercado, enquanto eu procurava aflito por um trocado, e o garoto que me ajudava ficou admirando de lado o meu improviso.

Teve uma noite também em que me deparei com seu cheiro. Foi de relance em um bar, aquele onde os caras insistem em ir só para reclamar, e eu toquei ombro com ombro alguma garota que saía do banheiro.

Semana retrasada, tropecei em seu caminhar. Foi na hora do almoço, enquanto eu decidia se mordia meu sanduíche ou ultrapassava outro moço, e dei de cara com uma menina que flutuava ao andar.

E, pra ser sincero, quase todo dia é assim: não sei se te vejo nos outros ou se, espelhado, sou eu que te vejo em mim.

parte de mim.

Parte de mim te ama, a outra também. Até queria conseguir te odiar – mas como isso iria rolar, se nunca de fato odiei alguém?

Parte de mim pensa em ti, a outra também. E seja lá qual for o pensamento, de relatório final ao preço do saco do cimento, seu rosto sempre aparece para me dizer que está tudo bem.

Parte de mim torce por uma mensagem, a outra também. Um oi no meio da tarde, um convite sem alarde, um “eu te amo” humano – sagrado ou profano – que me faça refém.

Parte de mim quer largar tudo e sair correndo para os teus braços, a outra também. Mas mesmo que não quisesse – pra não falar em pudesse –, abraçar com metade não aquece ninguém.

Parte de mim é sua. A outra, adivinhe, também.

você.

Olho para a mesa e ali está você.

Apoio o braço do lado direito da cama e você também está.

Divido o espaço do sofá contigo, converso horas com você dentro do carro e correr nas manhãs frias ficou melhor ao seu lado. Fazer mercado ficou mais leve, voar de avião já não é tão assustador e até fazer o imposto de renda – embora eu ainda não me renda – já é quase divertido.

Quando tenho um dia difícil, é você quem me abraça. Quando ele é incrível, celebro contigo. E mesmo quando nada acontece, o simples fato de te encontrar já é um evento – e eu voo pra casa feito o próprio vento.

Não sei o seu nome. Nunca vi o seu rosto. Nem sequer nos conhecemos e eu já te quero dentro do bolso. Porque sei que, seja lá quem for, já você está aqui comigo. E embora sozinho, já tenho um amor.

mudando de assunto.

Mudando de assunto, você mexeu no cabelo? Parece que finalmente resolveu desfazer aquela franja, bagunçou, improvisou uma trança… tá de cair o queixo.

Mudando de assunto, você mudou seu estilo? Nada contra suas camisetas com jeans, mas, ao menos pra mim, lhe caem melhor mesmo esses vestidos.

Mudando de assunto, você trocou de dentista? Pois sorrindo desse jeito, tão confiante e com ar satisfeito, ou seus dentes estão mais brancos ou você está feliz da vida.

Mas, mudando de assunto, vamos tentar não falar de você? Porque por mais que eu tente, esse papo sintomático – e um tanto quanto monotemático -, revela dolente que eu não sei te esquecer.

sem você.

Sem você sou cachorro que caiu da mudança. Gato sem bigode, leão banguela, camaleão daltônico que até percebe o perigo, mas acaba sempre fazendo lambança.

Sem você sou guarda chuva furado. Xícara sem alça, gaveta sem puxador, disco riscado que ainda vai pra vitrola com a vã esperança de ser tocado.

Sem você sou girassol em dia nublado. Cacto sem espinho, roseira sem botão, jardim seco que, de tão mal cuidado, acabou virando só mato.

Sem você sou pouco, quase nada. Sou manicômio carente de louco, cantor afônico e rouco; sou futebol em dia de sol, mas escasso de arquibancada.

sobre.

Não é sobre o céu. Nem sobre os seus planetas, suas estrelas, constelações, conjunções e delirantes cometas.

Também não é sobre o mar. Nem sobre sua maré, seus corais, ondas, arraias, o pescador de fé ou seus diferentes sais.

É sobre nós. Sobre eu, você, mentiras e verdades impossíveis de se dizer. É sobre o presente e o futuro, pouco ou quase nada sobre o passado; é meio que quase tudo sobre dois corações, emoções e a necessidade lasciva de um beijo demorado.

ainda ontem.

Ainda ontem encontrei aquele ingresso velho de teatro. Você estava linda, eu estava feliz e nem ao menos reclamei pelo tanto que você demorou para se maquiar – fazendo a gente chegar atrasado.

Ainda ontem tropecei naquela garrafa de vinho da Borgonha. A ocasião que tomamos pouco importa (ela virou, inclusive, peso de porta), mas pelo vexame que demos ainda tenho vergonha.

Ainda ontem usei aquele livro gigante que você me indicou. Não que eu tenha lido, na verdade nunca passei do prefácio mal escrito, mas ele caiu bem depois minha mesinha de centro quebrou.

Ainda ontem lembrei de você. Dei uma meia dúzia de sorrisos de canto de boca, lembrei que já te chamei até de louca e deduzi que jamais vou te esquecer.

Ainda.