Talvez seja o café que, frio dentro da caneca, siga sendo mexido mecanicamente. Talvez sejam os ladrilhos que, amarelados pelo tempo, ainda ecoam cenas de outrora. Talvez seja o cão que, esparramado no capacho da porta de entrada, nem pensa em levantar.
Talvez seja a música que toca abafada no rádio mal sintonizado. Talvez seja o enorme ônibus passando que abafe a canção ruidosa. Talvez seja o avião ainda maior e mais ruidoso cruzando as nuvens para abafar o ônibus, a música e os pensamentos.
Talvez sejam as fotos espalhadas pela sala. Talvez seja o espaço encolhido dentro do armário. Talvez seja a geladeira vazia, a caixa de e-mails cheia, o mercado não feito, a cama metade feita-metade desfeita.
Talvez seja a escova que sobra em cima da pia. Talvez seja o espaço que abunda na garagem. Talvez seja o despertador que tocava antes, o som de chuveiro que vinha depois, o silêncio seco que veio agora.
Ou talvez seja só a falta dela. Talvez.